04 jan 2018

Entrevista para BHZ sobre assédio sexual

Denúncias de assédio sexual em Hollywood dividem mulheres: ‘excesso de puritanismo”

Catherine Deneuve: “Liberdade de importunar é indispensável à liberdade sexual”

Nos últimos meses, Hollywood teve seus holofotes direcionados para outro assunto que não os seus filmes. Várias personalidades do mundo cinematográfico foram acusadas de assédio sexual ou, até mesmo, estupro. Entre esses artistas estão o ator Kevin Spacey, o produtor Harvey Weinstein e o diretor Brett Ratner, entre outros.

Com Kevin Spacey, as denúncias começaram em outubro do ano passado, quando o ator Anthony Rapp revelou, em entrevista a um portal, que havia sido assediado por Spacey. Em resposta às acusações, o ator da série “House of Cards” desculpou-se e disse ser homossexual. Porém, além dessa, surgiram outras acusações contra o ator, que, por causa das acusações, foi afastado da série.

Outro caso, que teve uma repercussão ainda maior, foi de Harvey Weinstein, que era considerado um dos homens mais poderosos de Hollywood. Em sua trajetória, foi responsável por produções como “Shakespeare Apaixonado” e obras de sucesso Quentin Tarantino. Também em outubro passado, um jornal revelou que o empresário havia feito ao menos oito acordos de sigilo que envolviam acusações de assédio sexual e contato físico indesejado. Isso foi só o início de acusações envolvendo o produtor. No total, mais de sessenta mulheres, entre elas Angelina Jolie, manifestaram-se contra ele.

Como forma de protesto contra os casos de assédios, atrizes se vestiram de preto durante a premiação do Globo de Ouro, no último domingo (7). Além disso, alguns atores usaram broches da campanha “Time’s Up”, uma entidade criada para lutar contra o assédio e pela igualdade de gênero. Mas, para a surpresa de muitos, uma atriz não aderiu ao protesto e usou um vestido vermelho na premiação. Blanca Blanco foi criticada por dispensar o preto no evento e como resposta, em seu Twitter, a atriz minimizou a decisão de usar uma peça que “fugia ao padrão”: “O problema é maior do que a cor do meu vestido”, publicou.

Harvey Weinstein foi denunciado por assédio por diversas mulheres, entre elas, Angelia Jolie (Reprodução/CNN Money)

‘Excesso de puritanismo’

Apesar de todo o protesto envolvendo as atrizes hollywoodianas, algumas mulheres também do mundo cinematográfico não se sentiram à vontade em tal situação. A atriz francesa Catherine Deneuve e outras 99 mulheres francesas denunciaram a existência de um ataque contra homens após o acontecimento envolvendo o produtor Harvey Weinstein. Segundo elas, a campanha contra o assédio #MeToo (“eu também”, em tradução literal) era “puritanismo” e foi movida por “ódio aos homens”.

Trecho do artigo assinado por Deneuve, publicado na última terça-feira (9) no jornal francês “Le Monde”, dizia o seguinte: “O estupro é um crime. Mas a paquera insistente ou desajeitada não é delito, nem é o galanteio uma agressão machista”, dizia. O objetivo da publicação era defender a liberdade dos homens “de importunar”. Além disso, no artigo, as mulheres afirmavam que não se reconheciam neste feminismo que vai além de denunciar abusos de poder, encarnando “ódio aos homens e à sexualidade”. Elas afirmam ainda que a “liberdade de importunar é indispensável à liberdade sexual”.

A atriz francesa Catherine Deneuve e outras 99 mulheres escreveram artigo em que se colocam contrárias aos protestos (Reprodução/Vip)

Afinal, até que ponto os elogios podem ir?

De acordo com a psicóloga e sexóloga Enylda Motta, a mídia tem o poder de manipular e, por esta razão, é difícil saber o que realmente está por trás de tudo isso. Sobre as denúncias de assédio, ela diz que é preciso ter coragem para falar. “A pessoa precisa ter coragem e amparo. Uma vítima manda força para a outra denunciar”. Ainda de acordo com a psicóloga, para tudo há limite, mesmo em se tratando de elogios. “A partir do momento que virar uma tortura e um peso, já vira um assédio”, define. Ela conclui dizendo que existe um limite entre fazer bem e fazer mal.

Para a jornalista e cinéfila Herlane Meira, a situação é assustadora. E afirma que todas essas denúncias só demonstram que Hollywood, por décadas, se manteve como um império de assédio. “Homens que tratavam mulheres não como profissionais, mas como oportunidades de diretores, produtores e atores famosos se aproveitarem”, afirma. Quando questionada sobre a manifestação feita pelas atrizes na premiação do Globo de Ouro, ela diz que, por ser uma premiação em nível mundial, com certeza a ação surtirá efeito. Para reforçar sua posição, ela cita um ditado tradicional: “Sua liberdade termina quando começa a do outro”.

Formada em Relações Internacionais, Marina Maia considera que o limite entre o elogio e o assédio é estabelecido por quem sofre. “Se chegou num ponto em que você se sente constrangida, esse é o limite. São poucas as mulheres que gostam de receber elogio de quem não conhecem”, relata. Além disso, ela diz que a polêmica não é apenas contra os casos de assédio, mas sim, sobre a igualdade de gênero. “A polêmica, na verdade, só ilustra o que grande parte das mulheres sofre em um ambiente de trabalho: ameaças, abusos e coisas do tipo. E, não para por aí, porque a diferença de salários também está em pauta no movimento, e acredito que vai trazer muita visibilidade para a questão da igualdade de gênero”, conta.

Quando questionada sobre a polêmica da atriz francesa Catherine Deneuve, a sexóloga Enylda Motta afirma que discorda da posição da atriz. “Tem que vestir roupa preta, sim, e tem que falar, sim”. Ela afirma que é preciso haver uma união e uma força para lidar com o assunto.

A psicóloga e sexóloga Enylda Motta diz que é preciso, sim, falar sobre os assédios (Reprodução/Arquivo Pessoal)

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